17 março, 2009

Pensamentos no dia


Clodovil morreu hoje. E sem discutir quem ele foi ou que fez, me chamou atenção a notícia que a decisão sobre a doação de seus orgãos e detalhes de organização do velório foi dos seus assessores políticos, pois não havia ninguem próximo, nem mesmo familiares para fazer isso. Pensei sobre isso.

Hoje a tarde, vagando um pouco por alguns blogs desconhecidos, li um post de uma mulher que chorava por não tem por quem chorar.

Acabei de entrar no site do Neto e li um post sobre o Pequeno Principe (assim que terminar o Castelo de Vidro, leio de novo esse livro). Pensei de novo.

Cativar e ser cativado, criar laços, ritos, tempo....a cor do trigo.

Hoje troquei inúmeros e-mails sobre absolutamente nada com amigos que transformaram " a cor do alumínio" ..rsrs, desculpem pelo trocadilho óbvio.

E agora estou aqui sentindo tudo isso, tudo tão misturado que não pretendo organizar.

Não cativo com muita facilidade e nem sempre invisto o tempo necessário pra isso.Principalmente quando lembro das pessoas que hoje me cercam de perto ou de longe, as vezes acho que elas me bastam, de tão especiais que são. Mas não é assim não. Há sempre mais do que imaginamos.

Às vezes dá preguiça, confesso. Mas o que me surpreende é o esforço que se faz pra encontra pessoas que sejam solos disponíveis, não para uma brincadeira só, mas para raízes. Jesus poderia estar falando disso também na parabóla do Semeador, por que não?

Nem de longe estou me queixando. Encontrei terras e terrenos maravilhosos. Comecei falando em cativar e terminei cultivando, é Neto, acho que uma coisa tem a ver com a outra sim!

Não ter alguém que saiba suas manias, chatisses, que conheça sua história, seus risos, choros, deve doer. Não chorar por alguém, não ter saudades sem fim, não ficar ansiosa pela chegada, deve doer, doer gelado.

Não sei quantas pessoas ainda me cativarão e quantas eu ainda cativarei, o jeito é viver pra ver.


Roubei o trecho do Pequeno Príncipe que estava no blog do Neto (vale a pensa passar lá pra ver). lindo.



XXI
E foi então que apareceu a raposa:
- Boa dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu polidamente o principezinho, que se voltou, mas não viu nada.
- Eu estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira...
- Quem és tu? perguntou o principezinho. Tu és bem bonita...
- Sou uma raposa, disse a raposa.
- Vem brincar comigo, propôs o principezinho. Estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa. não me cativaram ainda.
- Ah! desculpa, disse o principezinho.
Após uma reflexão, acrescentou:
- Que quer dizer "cativar"?
- Tu não és daqui, disse a raposa. Que procuras?
- Procuro os homens, disse o principezinho. Que quer dizer "cativar"?
- Os homens, disse a raposa, têm fuzis e caçam. É bem incômodo! Criam galinhas também. É a única coisa interessante que fazem. Tu procuras galinhas?
- Não, disse o principezinho. Eu procuro amigos. Que quer dizer "cativar"?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa "criar laços..."
- Criar laços?
- Exatamente, disse a raposa. Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
- Começo a compreender, disse o principezinho. Existe uma flor... eu creio que ela me cativou...
- É possível, disse a raposa. Vê-se tanta coisa na Terra...
- Oh! não foi na Terra, disse o principezinho.
A raposa pareceu intrigada:
- Num outro planeta?
- Sim.
- Há caçadores nesse planeta?
- Não.
- Que bom! E galinhas?
- Também não.
- Nada é perfeito, suspirou a raposa.
Mas a raposa voltou à sua idéia.
- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra.
O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...
A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor... cativa-me! disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer alguma coisa. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!
- Que é preciso fazer? perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás mais perto...
No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração... É preciso ritos.
- Que é um rito? perguntou o principezinho.
- É uma coisa muito esquecida também, disse a raposa. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, possuem um rito. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira então é o dia maravilhoso! Vou passear até a vinha. Se os caçadores dançassem qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu não teria férias!
Assim o principezinho cativou a raposa. Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:
- Ah! Eu vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Quis, disse a raposa.
- Mas tu vais chorar! disse o principezinho.
- Vou, disse a raposa.
- Então, não sais lucrando nada!
- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo.
Depois ela acrescentou:
- Vai rever as rosas. Tu compreenderás que a tua é a única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te farei presente de um segredo.
Foi o principezinho rever as rosas:
- Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela á agora única no mundo.
E as rosas estavam desapontadas.
- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda. Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é, porém, mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob a redoma. Foi a ela que abriguei com o pára-vento. Foi dela que eu matei as larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.
E voltou, então, à raposa:
- Adeus, disse ele...
- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa...
- Eu sou responsável pela minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.

7 comentários:

A. N. disse...

Tássia,

Engraçado vc dizer que cativa com dificuldade. Quando escrevi no blog que às vezes as coisas não são tão lentas quanto a Raposa descreve, lembrei de algumas pessoas, inclusive vc, que parecem que vão chegando já derrubando tudo, tomando seu lugar e dizendo que aquele canto é seu. Acho que não estou mentindo qdo digo que vc cativou a mim e a outras pessoas na primeira vez que foi lá em casa, só pra perder na mímica...

Mas cativar não é algo simples, não é algo exato. Nunca entendemos pq cativamos ou como somos cativados... mas como vc diz, não precisa organizar. Basta curtir e viver as raízes que brotam e, felizmente, insistem em não partir.

Bjins,

Neto

Rafael Pinheiro disse...

O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.

eu gosto dessa parte porque revela a relação narcísica que há nessa coisa de cativar. foi o tempo que eu investi que fez alguem se tornar tão importante...
é por isso que acho que o amor mesmo é inexplicável, e mesmo sem ser cativado ele acontece. sempre de forma inexplicável.
estou tentando aprender a amar, e descobri que o pequeno príncipe não é bom começo. mas de fato, é muito bonito, mas acho que só isso, bonito.
o que é realmente amar alguem? amar alguem....sim, como Deus ama a gente. sem interesse, ama porque ele , na verdade, tem uma obsessão por nós. amar por amar. existe?
acho que é a melhor forma de amar. estou tentando aprender isso. amar alguem por amar simplesmente. só assim que se ama o feio, o mal-talhado, mal amado, defeituoso.
bjs.
Rafael.

Anônimo disse...

Esse trecho é interessante, pois nessa parte o principezinho nao se deixa ser amado pela raposa porque se lembra do amor que sente pela rosa, unica para ele e para ela mesma, já que nao retribui esse amor, pois so pensa nela mesma, em ser amada e cuidada. Parece a historia do Jose que amava Maria que amava Joao que nao amava ninguem.
Talvez Clodovil seja como a rosa do livro, queria as atencoes para si só, mas infelizmente nao achou na vida um principezinho que tomasse conta dele e tirasse seus espinhos.
Qto a historia do ser eternamente responsavel por aquilo que cativas, é outra historia que vale um comentario: somos responsaveis por alguem só por sermos amados por ele? Isso cria quase uma escravidao emocional... pra mim amor tem que ser reciproco, nao pesado na balanca, mas reciproco, senao é prisao.
É preciso ficar atento para nao incorrermos no mesmo erro, de só querer dedicacao ou no oposto de só querer agradar. O equilibrio é fundamental.

Quem? Eu? disse...

Tu me cativou e pronto! :P

Marcus Cézar Belmino disse...

Eu sinto vontade de te ter perto toda hora, dividir contigo cada pedaço da minha vida e sinto um interesse enorme por saber cada pedaço da sua. Eu imagino como será o futuro com você e passo um bom tempo planejando. Experimento semanalmente uma grande saudade quando eu viajo e tenho que passar menos de dois dias longe de você. Me preocupo com cada coisa que acontece com você e compartilho sinceramente cada alegria e cada tristeza como se fossem minhas, porque na verdade também são. Eu preciso se você a cada instante, de um jeito que eu não sei explicar..você me cativou de uma forma única. Eu te amo!

Anônimo disse...

" (...) Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas (...)". Apesar de não abordar esta frase logo no início do meu comentário, ela saltou aos meus olhos. Fez-me lembrar quando a ouvi pela primeira vez, quando li o livro pela primeira vez. Li este livro 12 vezes: em cada uma, um estado de espírito diferente. Em cada releitura, uma interpretação era extraída da mesma palavra, das mesmas frases lidas outrora. Intrigante. Gosto muito de Tolstoi, Tchekhov, anuários, Barsa, National Geographic, Revista Minha Novela, Tititi. Folha de SP, New York Times e El Clarin. Quando mais eu busco, menos encontro. Eis que um dia, quase 10 anos após sair de minha cidade natal, acordo e penso o quê significa estar só. Ser sozinho. Ser sozinho é quando estamos no meio de um monte de pessoas, convivendo com vários amigos/conhecidos e sentimos falta de apenas uma pessoa. Sinto-me só. Em cada estado deste país que morei ou visitei, nos últimos 15 anos, sempre houve uma maciera. E perto de cada uma delas, às vezes, havia uma raposa. Silvio Santos e Clodovil, para mim, tornaram-se pessoas idílicas em essência. O maior camelô do mundo juntamente com o alto costureiro vendem sonhos, assim mesmo no presente: isto é atemporal. Seja um carnê do Baú ou o vestido de casamento de uma filha abastada, feito por Clodovil, são iguais pois são sonhos. Ficar perto do homem do Baú, para muitos, tem um sentido diferente. Ver o sr. Hernandez tornou-se obrigatorio: ele foi um dos deputados mais votados que o país já teve. Sempre contraditórios, ambos nunca aderiram aos modismos do tempo. Eles atribuíam modismo, pois nós somos a raposa. Nós fomos cativados pelo sorriso do Sr. Silvio, pelas confusoes do Clodovil. Eles nos cativaram, em cada tarde de domingo, pouco a pouco, entrando em nosso lar. Clodovil, autêntico, tinha um jeito sui generis de cativar. Sempre viveu com muitas pessoas sem, talvez, sentir falta de alguem, solidão. Vá em paz, siga seu caminho. Os maiores gênios da humanidade quase sempre foram renegados à cova comum, esquecidos. Mas nós não aprendemos com a história. Temos memória curta. Sensacionalismo vende mais, faz mais dinheiro. Não importa a Africa do Sul ter sofrido com o apartheid: pois ela negou o visto de entrada a Dalai Lama. Somos ignorantes, de espírito vil: no circo, o povo ri quando o palhaço cai, suspira quando o leão tenta comer o domador ou mesmo perdemos o fôlego por causa do globo da morte. Não nos interessamos pelo cachorro acrobata, pelos malabares ou pelo mágico fraudolento. Clodovil ganhou meu respeito. Digam o que quiser, isto não está aberto à discussão. Silvio Santos é um vencedor, e tambem tem meu respeito. Mas ainda temos o cativar, a frase de início: é um contrato covarde e traiçoeiro. Isto porque, na maior parte das vezes, o é quebrado unilateralmente. Clodovil se foi, quem me disse esta frase pela primeira vez, tambem. Um vazio ficou no lugar, sem que eu tivesse tempo de perguntar o porquê. Mas a vida é assim: um dia a gente perde, no outro empata mas no terceiro a gente ganha. Não sei, complexo isto. Certamente irei pensar sobre este assunto por mais algum tempo... Parabéns Tássia. Acho que você assumiu uma grande responsabilidade ao ser "cativadora".

Anônimo disse...

Sim sim, ainda tem o alumínio. Da terra, extrai-se a matéria prima da alumina metalurgica, com a qual produzimos o alumínio do dia a dia. Colocamos um pouco de carvão aqui, uma soda caustica ali. No meio disto tudo, descobrimos reacoes secundarias imprevisiveis, ligacoes quimicas que nao sao explicadas em lugar algum: a amizade. Ellen, Tássia, Tonny e Morais formam uma ligacao quadrupla bidirecional :) ! Sao os que possibilitam os essenciais momentos de alegria para suportar o fardo diário de se conviver com injustiças e incertezas. Vcs sao demais!